Trabalho garante dignidade
País carece de mais instituições qualificadas para cuidar dos idosos
Segundo o presidente da Igreja Evangélica de Confissão no Brasil (IECLB), pastor Nestor Paulo Friedrich, com o rápido envelhecimento da população, será cada vez mais necessário colocar à disposição das famílias instituições como a Pella Bethânia para cuidar de pessoas idosas e com necessidades especiais. “Pelas transformações pelas quais a família passa, muitas não conseguirão suprir as demandas de cuidados”, observa.
Para Friedrich, sem o apoio de instituições, a sociedade teria dificuldades no cuidado de quem não tem mais um suporte familiar. “Visitar, ouvir histórias, conversar com as pessoas são atitudes que proporcionam convivência e alegram quem reside numa instituição”, diz.
“É uma casa onde acolhemos e cuidamos”
Como mudar a visão da sociedade quanto ao trabalho e vivência nesses locais?
Nestor Paulo Friedrich– A melhor forma de desconstruir a imagem negativa que algumas pessoas têm das instituições de longa permanência é por meio da visita, da conversa com a coordenação e com quem reside no local. Hoje, percebemos que cada vez mais as pessoas idosas escolhem viver numa instituição, pois querem viver em comunidade, ter atividades recreativas, companhia para uma caminhada e cuidados com a alimentação e saúde. Essa realidade é um indicativo de que viver numa instituição não é ruim, mas sim uma oportunidade para viver o processo de envelhecimento junto com outras pessoas, sabendo que receberão cuidado adequado quando necessário.
Como despertar a responsabilidade social nas empresas?
Friedrich – Várias empresas desenvolvem um programa de responsabilidade social, seja por exigência da lei ou por entenderem que podem, por meio de ações, ajudar a construir um mundo mais justo para todas as pessoas. Muitas fazem parcerias com instituições sociais para desenvolver o seu programa e isso contribui para a sustentabilidade financeira da instituição. Para fortalecer essa parceria, é importante montar um plano de ação conjunto, ou a empresa ter conhecimento do trabalho desenvolvido, acompanhando, dessa forma, também a aplicação dos recursos. Uma parceria em que existe transparência na gestão com certeza terá durabilidade.
Qual a importância da ação diaconal?
Friedrich – Somos uma igreja cristã e acreditamos que Deus, por sua graça, nos concede tudo o que é necessário para termos uma vida com qualidade. Por gratidão a esse cuidado de Deus por nós, realizamos ações para cuidar das pessoas e de toda a criação. Essas ações nós chamamos de diaconia (ancoramos essa definição no Evangelho de Marcos 10.45). Para a IECLB, a diaconia é uma dimensão inerente à missão da igreja, assim como a liturgia, a comunhão e a evangelização. Dessa forma, faz parte da essência da igreja promover ações para que todas as pessoas tenham vida em abundância. A ação diaconal pode ser tanto uma visita a pessoas doentes quanto a organização de uma instituição para cuidar de pessoas idosas ou de crianças. Entendemos que é responsabilidade do Estado propiciar cuidado às pessoas por meio da assistência social. Mas não podemos nos afastar do nosso compromisso. Assim, muitas instituições foram criadas pelas comunidades para ajudar o Estado a cumprir sua tarefa. O Pella Bethânia é uma instituição diaconal, que foi criada porque pessoas tiveram um olhar de misericórdia para com as crianças órfãs e decidiram construir uma casa para acolher, cuidar e, dessa forma, transformar a realidade de dor e sofrimento.
Considerações finais
Friedrich – A história da Pella Bethânia é um testemunho vivo da própria história da IECLB. As primeiras comunidades luteranas que se constituíram no Brasil, por mais ermo que era o local para onde organizavam sua convivência, zelaram para que a população contasse com escola, templo, sociedade cultural, cuidado das pessoas enfermas e idosas, cemitério, casa pastoral e pastor. Esse é o testemunho vivo da IECLB. Pella Bethânia é prova dessa história e desse testemunho.
“Somos parte de uma sociedade excludente”
Pastor Sinodal Gilciney Tetzner destaca a necessidade de promover a inclusão e desmistificar
o preconceito em relação às instituições como a Pella
Para Gilciney Tetzner, pastor sinodal, o ser humano faz parte de uma sociedade excludente, que traz na sua história as marcas do sofrimento causado pelo abandono e pela negligência diante da pessoa idosa ou com deficiência.
Ressalta que a Comunidade Pella Bethânia, como instituição de longa permanência, tem no cuidado à pessoa a principal referência. “Em uma sociedade que caminha a largos passos para o individualismo cada vez mais acentuado, esta comunidade oferece espaços de vida, promovendo a inclusão e dignidade humana por meio do restabelecimento de laços quebrados, como, o familiar e o social”, afirma.
Tetzner diz que é importante buscar formas de despertar nas pessoas e na sociedade uma sensibilidade para o exercício e vivência de relações fraternais por meio da solidariedade e ajuda mútua. “Isso é possível por meio das visitas, da aproximação entre pessoa, comunidade e instituições. Essa aproximação será um elemento importante para essa nova visão”, conclui.
Outro desafio é quanto ao preconceito e à concepção negativa em relação a essas instituições de cuidado. Segundo ele, a ideia de que asilo é um local de abandono e de isolamento de pessoas que não encontram mais a possibilidade de cuidado no seio da própria família ainda permanece em boa parte no imaginário de muita gente.
De acordo com Tetzner, mudar o nome oportuniza a reaproximação com um novo olhar para a Pella. Por outro lado, o ser “comunidade” expressa melhor o que caracteriza a instituição como espaço comunitário de crescimento conjunto, de fortalecimento da fé, de desenvolvimento das aptidões (dons) pessoais e de colocá-las a serviço do próximo numa prática solidária.
Doações são fundamentais
Para o pastor, o envolvimento de empresas e pessoas nas ações e projetos sociais é fundamental para garantir mais qualidade de vida aos residentes. “À medida que essas se fortalecem, temos condições de melhorar nosso trabalho”, afirma.
Cita que o lado social está na origem da instituição. Quando fundada faz 125 anos, seu objetivo foi o de ir ao encontro das necessidades de pessoas em vulnerabilidade social, como espaço acolhedor e restaurador da vida em sua plenitude. Por isso, assim como a IECLB acentua, de forma especial nestes últimos anos, a necessidade do cuidado, a Pella Bethânia sempre colocou seu foco nessa perspectiva. “Até porque a fé não pode ser desvinculada da vida, antes, aprofunda e exige maior intensidade nas relações que humanizam por meio de ações transformadoras”, finaliza.
“Formamos uma família cristã ecumênica”
Com o violão, a Bíblia e sempre sorridente, recebe os residentes na porta da igreja. Segundo a Pastora Marli Lutz, o lado espiritual é muito importante para trazer alívio, conforto e paz a quem escolheu morar no lar ou foi levado pelos familiares.
Marli iniciou a vida religiosa há 35 anos em Rondônia. Chegou à comunidade em junho deste ano, pouco tempo depois do marido morrer em um acidente de trânsito. A recepção foi calorosa e cheia de amor, sentimento que ela transmite todos os dias nas conversas em grupo ou individuais. “A vida aqui é intensa e muitos chegam com vários problemas, sejam físicos ou psicológicos”, comenta.
Segunda ela, a sociedade caminha para um caminho de marginalização e exclusão de muitas pessoas, como idosos e pessoas com deficiência. “Aqui nossa missão é incluir, dar amor e condições para uma boa convivência, já que muitas pessoas vieram de famílias desestruturadas e vítimas de violência”, explica.
Conforme a pastora, a maioria das pessoas é desprezada pelo sistema capitalista quando deixa de ser produtiva. Mas o lar tenta motivar e mostrar que, apesar da idade ou das limitações, as pessoas ainda têm condição de ajudar, trabalhar e ser útil. “Temos que ser solidários e não sentir pena. Muitas pessoas estão carentes da graça e do amor de Deus. Precisamos ser mais fraternais”, afirma.
Diz que os residentes fazem nascer uma relação de ternura, fundamental para viver a vida com plenitude. “Aqui encontramos amparo para viver a vida sem olhar as condições financeiras, físicas ou psicológicas”, frisa.
A espiritualidade é trabalhada diariamente em cultos, meditações, aulas de canto e demais atividades. “Cantamos e rezamos na língua alemã e assim mantemos viva a tradição e o lado espiritual de muitos residentes, independente da religião”, observa.
Na opinião da pastora, a espiritualidade é uma forma de unir as pessoas, de perceber suas aflições e necessidades, e assim buscar o processo de cura. “Aceitar, respeitar, escutar, ensinar e fortalecer o lado humano de cada pessoa. Tudo isso nos deixa melhores e nos aproxima”, finaliza.
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